domingo, 7 de março de 2010

A BARBÁRIE NA ESCOLA OU A ESCOLA DA BARBÁRIE

Numa mesma semana, um menino de 12 anos, cansado de tanta agressão e, sobretudo, de tanta indiferença, atirou-se ao Rio Tua ao encontro da morte. E foi conhecida a acusação do Ministério Público contra um homem de 33 anos de idade, ex-aluno do Colégio Militar, que entre 2001 e 2003 abusou de 7 alunos com idades entre os 9 e os 12 anos.

No primeiro caso, é agora referido que as agressões eram contínuas, até já tinham levado anteriormente a um internamento hospitalar de 2 dias e aparentemente ninguém quis saber nem ninguém tomou qualquer medida efectiva. No segundo, fica-se a saber que o referido ex-aluno do Colégio Militar (onde andou durante 8 anos) tinha não só “muito prestígio” como também “permissão para entrar na instituição quando quisesse e com quem quisesse” e ainda que as razões do silêncio das vítimas e dos seus colegas acerca dos abusos são as de que “era impensável alunos do 1º ano dizerem não a um aluno mais velho” e que “aquilo é uma hierarquia, quem está em cima é que manda”!...

Ora, para além da mais absoluta inaceitabilidade deste tipo de situações e da necessidade de apuramento até ao fim das respectivas responsabilidades, ao nível não apenas dos agressores mas também de todos aqueles que com a inacção, a incúria ou o silêncio cúmplice possibilitaram que agressões e abusos como estes pudessem ocorrer e repetir-se sempre impunemente, creio que é preciso ir mais longe e mais fundo!

É necessário discutir a sério o que são hoje as nossas Escolas (públicas ou privadas, civis ou militares), que conteúdos, que princípios e que valores nelas são ensinados e de que modelo de sociedade curam elas de assegurar a respectiva e acéfala reprodução.

É preciso assim denunciar o abandono de qualquer perspectiva cívica, a completa desvalorização da pessoa humana e da sua dignidade, bem como a descaracterização e mesmo o descrédito do Trabalho como factor de realização pessoal e profissional, e a substituição desta concepção por uma lógica de “fábrica” ou de “quartel”, de par com a ideologia própria da chamada “globalização” assente na pregação do dinheiro, do poder, da competitividade e do “sucesso” como os valores supremos de aferição de todas as condutas, a deificação do individualismo extremo e a afirmação de que os fins justificam todos os meios, tudo de par com uma espécie de “darwinismo social” que tende a demonstrar a “bondade” e a “inelutabilidade” da ideia de que na sociedade actual "naturalmente" não há nem pode haver lugar para os mais fracos e mais vulneráveis, para os idosos, para os doentes, para os deficientes, para os simplesmente diferentes.

E, logo, tudo o que encaixe em tal concepção do Mundo é, senão aceitável e até positivo, pelo menos tolerável e compreensível…

Que este debate possa ser levado a cabo de forma consequente e que ao menos desta feita os gritos das vítimas não sejam, uma vez mais, abafados pelo manto diáfano do silêncio, com a já habitual invocação da pretensa necessidade de “não criar alarmismos” ou de que quem denuncia estes autênticos regressos à barbárie estaria afinal a levar a cabo meras campanhas de “manipulação da opinião pública”!

4 comentários:

  1. E o mais triste é o silêncio do Ministério da Educação, é o silêncio do Primeiro-Ministro, é o silêncio do Presidente da República. Estimado Garcia Pereira termino com a intervenção de Carlos Rabaçal neste vídeo http://www.youtube.com/watch?v=SKlLsW5G69Y

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  2. Meu Caro João Soares, agradeço-lhe o seu comentário e compreendo a sua revolta perante os vários (e incompreensíveis) silêncios. Mas, com todo o respeito por opiniões distintas da minha, sinceramente acho que a posição do meu colega de programa da RTP Carlos Rabaçal não só se revela confusa, por meter demasiadas coisas para dentro do mesmo saco como, sobretudo, escamoteia que a Escola é hoje e em larga medida um lugar subordinado à "lógica de fábrica", um local de repressão e de reprodução da ideologia dominante e, logo, tendencialmente de formação de autênticos anti-cidadãos...

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  3. Pelos vistos, Dr. Garcia Pereira, o Buillyng também funciona com os professores. Soube hoje pela TSF, que um professor de música numa escola em Sintra, foi vítima dos alunos, suicidando-se em Fevereiro passado no Tejo e depois de ter feito 7 vezes, queixa na direcção da escola.
    Onde vai parar este País?! ainda por cima soube-se apenas porque o jornal i descobriu.
    Estava bem encoberto... para levar tanto tempo, a chegar à opinião pública... e se não chegasse nem inquérito havia...

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  4. Pois, só hoje é que o caso foi noticiado pela televisão. E se o bullying também existe para com os professores, a sua existência é coberta pelo mesmo manto de silêncio cúmplice.

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