Creio ser importante reflectir sobre o significado e real alcance dos resultados eleitorais do passado Domingo, 23 de Janeiro.
Assim, e antes de mais, tenhamos presentes estes números:
Inscritos 9.629.630
Abstenções 5.139.728 (53,37%)
Votos nulos 86.543 (1,93%)
Votos em branco 191.159 (4,26%)
Total 5.417.430 (59,56%)
Tudo isto significa que apenas 40,44% dos eleitores inscritos exprimiu votos válidos, pelo que os 52,94% (correspondentes a 2.230.104 votos) obtidos por Cavaco Silva representam afinal apenas cerca de 23,16% do total dos eleitores!
Por outro lado, este número de votos representa qualquer coisa como menos 543.000 do que os obtidos por Cavaco em 2006, o que torna em absoluto claro que aquilo que afinal lhe permitiu esta vitória à primeira volta foi a abstenção e, também, o elevado número de votos nulos e, sobretudo, em branco. Ou seja, mesmo aqueles cidadãos que se abstiveram ou votaram branco ou nulo pretendendo com isso demonstrar o seu desagrado perante a situação do País e a responsabilidade nela dos vários partidos do Poder, o que acabaram por fazer foi facilitar e viabilizar a eleição de Cavaco…
Por fim, o próprio discurso de vitória de Cavaco Silva não passou, para além dos lugares comuns e dos auto-elogios do costume, de uma incontornável manifestação de dois factos particularmente significativos.
Por um lado, uma profunda incapacidade, própria de quem não é democrata, de saber ganhar, atacando de forma descabelada e injustificada todos os seus adversários e como se ele, ainda agora, não tivesse que dar explicações ao País acerca das várias situações que lhe foram sendo apontadas, desde as condições privilegiadas que lhe permitiram um lucro de 140% nas acções da SLN até ao famigerado “caso das escutas a Belém”, passando pelas ligações perigosas da sua entourage política (como Dias Loureiro, por exemplo) a variados negócios obscuros.
Por outro, a indisfarçável perturbação que a realidade dos números eleitorais – embora logo transformados na Comunicação Social ao seu serviço, com a SIC e a chamada imprensa económica à cabeça, em “grande vitória” - necessariamente encerra. Exactamente porque tais números o que mostram é que a política de austeridade e de vende-pátrias, sempre apadrinhada por Cavaco Silva, até aqui aplicada por Sócrates, e quando este, pelo seu isolamento e desmascaramento se tornar imprestável para esse efeito, por Passos Coelho, está afinal muito longe de ter obtido o apoio que a Direita esperava alcançar…
E é por isso mesmo que é hoje mais actual e importante do que nunca afirmar que… a Luta continua!
Que 23% da população eleitora se imponha ao resto da sociedade não é culpa das pessoas que se negam a participar neste processo (como parece insinuar), é sintoma de que o próprio sistema não funciona com justiça e os chamados defensores da democracia deveriam ficar mesmo envergonhados de contribuírem a manter este sistema, tanto os ganhadores quanto os perdedores. Se quase 60% da população decide não participar deveria ficar o lugar vago. Qual é, senão, a percentagem mínima moral de participação necessária para legitimar umas eleições? 40%, 30%, 20%, 100.000 votos?
ResponderEliminarBruno
O Drº Anibal Cavaco Silva ganhou devido à abstenção, isso é um facto.
ResponderEliminarEu fui votar, mas conheço várias pessoas que não foram, e não concordei com a decisão.
Contudo concordo plenamente com o sentimento.
"A Democracia de hoje pede-lhes para ir ás urnas votar, nada mais.
Uma vez que tal tenha sido feito e os votos tenham sido contabilizados, parece que nós concordamos por consenso que a pessoa eleita como PR, PM ou Deputado pode tomar qualquer tipo de decisão que lhe interesse e/ou ao seu partido durante o mandato."
Isto é o que os jovens sentem actualmente.
Que o 25 de Abril, por nossos pais e avós não foi suficiente. Contudo, muitos encostam-se a este contentamento descontente.
Em termos jurídico-constitucionais, não há, ao contrário do que já vi dizer várias vezes, número mínimo de votos para legitimar um resultado eleitoral. E como os "aparelhos partidários" vão lá sempre votar, fácil é de ver que os seus candidatos serão sempre eleitos.
ResponderEliminarAgora, do ponto de vista político, se a grande maioria dos cidadãos não vai votar porque já não acredita nas eleições, isso tem um significado muito importante que não é possível contornar, pelo que representa de perda de ilusões na democracia parlamentar burguesa. E aí as coisas estarão muito mais adiantadas do ponto de vista da Revolução do que alguns pensam...
E a compreensão de que o 25 de Abril não foi tão longe quanto devia ter ido (ou seja, não se deveria ter resumido a uma mudança de regime mas deveria ter operado uma mudança de sistema) e que desta vez as coisas têm de ir mais longe, representa um importantíssimo passo em frente.
E os Jovens, como sempre aconteceu ao longo da História, estão na primeira fila desse combate!